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Cruzando a fronteira: como José Noblecilla fez de São Paulo a sua nova casa

jul 30, 2021 10 MIN LEITURA Melissa Cruz Cossetti

Diretor de Engenharia, Data & Engenharia de ML na Wildlife, José conta a história de como ele se apaixonou pela cultura brasileira. 

A história de José Noblecilla com o Brasil começou em 2014. De lá para cá, José — Diretor de Data Engineering na Wildlife — tornou-se hábil em descobrir sabores e refúgios urbanos. Formando em Engenharia de Software, pela Pontificia Universidad Católica del Perú, José estava cursando a sua segunda graduação, Matemática, quando decidiu largar a nova formação e um emprego no seu país para tentar um mestrado em tecnologia no Brasil.

A decisão de sair de Lima e cruzar a fronteira foi um ponto de virada importante, e aos 23 Jose iniciou vida nova no Brasil.

Ele pegou o passaporte e comprou uma passagem só de ida para dar sequência aos estudos em software. A princípio, a ideia era acompanhar a namorada, que tinha planos semelhantes. Desde então, são seis anos de uma brasilidade construída ao lado de muitos Wilders, naquela que virou sua nova casa: a capital de São Paulo, também conhecida como o principal centro financeiro do Brasil.

Logo no primeiro semestre em terras brasileiras, José teve o seu primeiro encontro com um Wilder: o CTO e co-fundador da Wildlife, Michael Mac-Vicar. Mike deu uma palestra dentro de uma disciplina do curso de Jose, na USP. Uma coincidência bem-vinda, que possibilitou a primeira conversa entre eles, ao fim do evento. Foi nesse papo que José soube que a empresa (até então chamada de TFG, Top Free Games) estava contratando talentos.

Mesmo com o tempo tomado pelo mestrado, José decidiu conhecer a empresa, muito influenciado pelo conhecimento que Mike trouxe na palestra. Era claramente uma oportunidade que ele não poderia deixar passar. Mas, o que parecia ser um processo de recrutamento comum, ganhou contornos curiosos, salpicados por diferenças no idioma e algumas peculiaridades do candidato com tecnologia.

“A parte engraçada é que eu mandei um e-mail, e a recrutadora disse que queria bater um papo comigo na Wildlife. Naquele momento, eu nem sabia o que significava ‘bater papo'”.

UMA ENTREVISTA PECULIAR

Depois de consultar o Google para saber o que era “bater um papo” (afinal, algumas expressões em português podem ser um mistério para quem acabou de chegar ao Brasil), José foi ao escritório da empresa. Naquela época, a Wildlife funcionava em um local bem menor e tinha pouco mais de 25 pessoas circulando pelos corredores.

Chegando lá, ele foi recebido por um recrutador, com quem falou sobre as suas experiências acadêmicas e profissionais anteriores. Até o momento, tudo sob controle. Foi quando a conversa entrou num tema que não poderia faltar na Wildlife: jogos. Mais especificamente, jogos mobile.

“Hoje, você joga alguma coisa?”, perguntou o recrutador. José, um estudante dedicado que estava focado em concluir o seu mestrado, deu a resposta mais sincera possível, ainda que constrangedora: não estava jogando nada. O pior: ele nem tinha um celular. Na vinda para o Brasil, ele não achou necessário, e para chegar até o escritório aquele dia, ele havia imprimido um mapa e feito como qualquer turista estrangeiro (nos anos 90) faria.

“Aí o cara surtou. ‘Como assim? Como você vive?'”, recorda gargalhando. A história de José intrigou o recrutador. Afinal, o que motivaria um candidato como ele? Não era comum alguém, sem nenhum contato com jogos mobile, ter interesse em trabalhar numa empresa de jogos. Mas como a diversidade é benéfica e bem-vinda, o perfil de José foi encarado como um grande ganho para a empresa.

Depois do bate-papo peculiar, ele ainda passou por duas entrevistas técnicas em que foi aprovado em ambas, umas delas pelo próprio Mike. Em uma delas, o CTO perguntou a José: “Você quer trabalhar com jogos?”. “Não, se for para fazer jogos eu não quero. Eu quero trabalhar com dados”, ele respondeu, afinal era a sua especialidade.Só que não havia um time voltado para engenharia de dados naquele momento. Mas, se não tem, pensou, podemos criar.

Duas semanas depois foi convidado para fazer um teste durante o seu mês de férias do mestrado. Era a oportunidade final que José precisava para mostrar o seu valor e conquistar uma vaga que ainda nem existia – e foi o que ele fez.

JOSÉ ENTRA NO JOGO

Começar a trabalhar na Wildlife fez com que José mudasse de rota novamente, abandonando o mestrado no meio do curso e engatando uma carreira no mercado de trabalho. “Naquele momento eu já sabia o que eu queria fazer e queria muito trabalhar lá. Eu tinha gostado das pessoas, principalmente das pessoas, e achava que a empresa iria bombar”. E bombou!

Naquela altura, José trocou sua tese de mestrado pela empresa na sua fase inicial, e deu início a um trabalho de dados que só ganharia força nos anos seguintes. Hoje, o time de dados, liderada por José, é formado por 35 pessoas.

Para além da empresa, outras coisas também mudaram desde que José que chegou no Brasil. Além de se tornar um líder entre os Wilders, adaptou-se muito bem à cultura gamer e já tem seu próprio smartphone. Agora, joga sempre que tem tempo livre. Inclusive, é um dos mais animados em testar os jogos e fazer alguns campeonatos internos dentro da Wildlife.

“Sempre que tem um beta novo eu baixo, fico jogando e fico viciado. Já montei competições dentro da empresa e já ganhei algumas delas também. O que eu mais jogo é Tennis Clash!”

UM PERUANO CONQUISTADO PELO ESTÔMAGO

Se durante o mestrado e morando no Butantã, perto da USP, José era um estudante que não saia muito e interagia pouco com a cidade, isso mudou com quando passou trabalhar e a morar mais próximo dos escritórios Wildlife, hoje no bairro do Itaim Bibi.

Nos primeiros anos, ele confessa que ficou no que chamou de zona de conforto, tentando procurar coisas no Brasil que lembravam o Peru. Contudo, com o tempo, se apaixonou por culturas locais e descobriu sabores da gastronomia que o levaram a vários lugares novos.

“Tenho um princípio de não pagar por comida que eu mesmo sei fazer. Então, eu só ia a lugares que eram totalmente diferentes, com comida nordestina ou mineira, que eu não saberia fazer em casa. Mas, chegou ao ponto de eu gostar tanto de comida nordestina que fiz minha própria carne seca”, conta.

Com cerca de três anos de Brasil, José decidiu sair da zona de conforto e explorar mais a cidade, até que conheceu o samba e começou a viajar mais.

“Isso me deixou mais tranquilo para decidir. Eu já não sentia mais que estava no Brasil por causa do antigo relacionamento. Hoje eu estou super confortável e até aprendendo a tocar pandeiro”.

José conta que é exigente no cardápio, mas também no ambiente. Além de boa gastronomia, dá preferência a lugares em que o destaque é a música brasileira e a interação com paulistanos seja na hora de ouvir um samba, comprar plantas ou um café. Aqui, ele elencou seus lugares favoritos na cidade

TOP 3 LUGARES PARA CONHECER (depois da quarentena) DE ACORDO COM ELE

Wildlife_Casa_de_FranciscaCasa de Francisca
Patrimônio histórico recém restaurado, a Casa de Francisca fica no Palacete Teresa, que abrigou a primeira loja de instrumentos musicais da cidade, a Casa Bevilacqua, a editora de música Irmãos Vitale e também a rádio Record, chegando a região a ser conhecida como “A esquina musical de São Paulo”. Lá, música é coisa séria. Durante os shows, o serviço de mesa não é feito em respeito aos músicos. Ou seja bebida e comida só retirados no balcão.
(Foto: Divulgação/Casa de Francisca)

Wildlife_Casa_BarbosaCasa Barbosa
A Casa Barbosa é uma pequena casa de show tombada pelo patrimônio histórico, leva o nome em função de ter abrigado a antiga pensão fundada pela Dona Barbosa, numa construção dos anos 20. Por lá o espaço é pequeno, os shows começam pela tarde a preços populares e costumam lotar até a calçada. Chegue cedo. O ritmo é samba de raiz, mas também tem espaço para jazz e blues, regados por drinks, caipirinhas e cervejas.
(Foto: Divulgação/Casa Barbosa)

Wildlife_Centro-SPCentro Histórico de São Paulo
O Centro Histórico tem tantos atrativos que é difícil escolher um só. É o bairro que corresponde ao trecho de terra em que a cidade foi fundada, em 25 de janeiro de 1554. Como atrações que valem a visita podemos listar: a Praça e a Catedral da Sé, o Páteo do Collegio (Museu de Anchieta), o Solar da Marquesa, o Mosteiro de São Bento e o Mercado Municipal de São Paulo (ou Mercadão, como é carinhosamente chamado). A lista é enorme.
(Photo: Diego Torres Silvestre/ Flickr)

UM JOSÉ BEM BRASILEIRO

De acordo com o próprio José, uma coisa que mudou de forma bem clara é que o “Jose peruano” era mais recluso. Acostumado ao mundo acadêmico, não trabalhava tanto em time, era mais focado nos próprios objetivos e ainda escorregava em expressões locais.

Wildlife_Jose-Noblecilla_party_eng“Uma coisa que eu gosto muito é essa mistura no Brasil e a língua tem sido fundamental para conseguir entender melhor as pessoas. Eu sinto que, agora, o português já está bem natural. Eu já procuro um tutorial para fazer pão na internet em português e não mais em inglês ou mesmo espanhol. Hoje eu sinto que português é um ponto central na minha vida.”

No começo, porém, Jose conta que se adaptar a língua foi um pouco frustrante. Várias ideias que apareciam em reuniões e conversas ele precisava pôr no papel para se explicar. “Mas eu era muito nerd também”, ele ri.

“Quando eu vim para cá, senti o Brasil acolhedor. Senti que podia confiar nas pessoas, que podia confiar no meu time. Mudei de ser a pessoa que resolve os problemas sozinho para ser a pessoa que consegue confiar e resolver junto com os outros. Hoje estou tranquilo em delegar coisas. Foi um aprendizado, principalmente cultural.”

Além de tocar pandeiro e tentar emplacar gírias nordestinas (um dos seus melhores amigos é do Nordeste), o “José brasileiro” percebeu que também pode confiar mais nas pessoas, e passou a gostar de dividir mais momentos com elas. Entre os aprendizados estão alguns novos hábitos sociais, incluindo participar dos happy hours e se divertir com a equipe.

Sobre todas as mudanças que viveu, José entende que tornar-se um Wilder foi parte importante da jornada. Porém, reconhece que há espaço para a diversidade, com pessoas que curtem mais ou menos o risco, havendo espaço para todos os perfis de na empresa.

“Eu gosto muito do risco, quando tem algum problema eu fico muito animado. Para mim esse é o cenário perfeito, estou no Brasil, trabalhando e fazendo as coisas que gosto.”

Mobility jul 30, 2021 Melissa Cruz Cossetti