Wildlife

#9YearsBeingWild: Nós redefinimos a nossa cultura para desenvolver jogos melhores

jul 22, 2020 16 MIN LEITURA Mick Hocking

Mick Hocking, VP de Game Development, compartilha a sua experiência à frente do game studio da Wildlife e a sua participação nas nossas mudanças culturais.

 


 

Uma pergunta inesperada feita por um headhunter a serviço da Wildlife gerou uma guinada imprevisível na minha vida: “Nós temos uma oportunidade para você, Mick. Você toparia mudar para o Brasil?”

Fosse em qualquer outra situação, eu teria educadamente declinado a oferta e jamais ouviria falar da empresa novamente. Ainda assim, em 2019, eu me encontrava em um momento onde, depois de 27 anos trabalhando na indústria de video games como um executivo de fabricante de consoles e desenvolvedor de jogos, eu estava contemplando a aposentadoria.

Eu já tinha visto (e feito) muito durante meu tempo no mercado, e passei a maior parte de 2019 viajando o mundo, escalando montanhas e me aventurando em busca de novas inspirações. Eu já havia recebido ofertas de empresas de jogos europeias, mas todas elas me deram aquela impressão de “já vi esse filme antes”.

No início, a ideia de dar esse enorme salto e trabalhar para essa empresa no Brasil era bem improvável, mas ela tomou mais consistência depois de uma conversa com o Mike (Mac-Vicar, o CTO da Wildlife) e um de seus investidores. Eu trabalhei com inúmeros excelentes desenvolvedores e experts técnicos, mas fiquei realmente impressionado após esse papo. “Mick,” ele disse, “por que você não pega um avião e vem para cá, passar um tempinho com a equipe, ver como eles trabalham, e aí depois você me diz o que acha?”

Ele estava certo: afinal, o que eu tinha a perder? Se eu gostasse, seria uma experiência nova para mim, uma aventura de verdade. É difícil de encontrar, hoje, alguém que tenha vindo do mercado dos consoles de mesa, tendo desenvolvidos os jogos “AAA” do setor, e que tenha feito essa mudança para a indústria de jogos para dispositivos móveis. Eu sabia que isso seria um enorme – e novo – desafio para mim. E se eu não gostasse, bom, eu só precisaria pegar o primeiro avião de volta à Inglaterra e encerraria o assunto.

Quando eu finalmente cheguei e conheci a equipe, eu realmente gostei. Na verdade, eu amei o que vi.

A minha história aqui na Wildlife é relativamente curta por enquanto, especialmente se você a comparar com as de pessoas com seis, sete, nove anos de casa. Mas em apenas nove meses, eu já consegui fazer tanta coisa que me parecem décadas de trabalho. Veja bem, a Wildlife estava em uma situação “diferente” quando eu ingressei. Por um lado, ela tinha tantos dados nas mãos que isso me apresentou a uma forma inteiramente nova de desenvolver jogos. Por outro, a empresa não contava com alguns aspectos essenciais que eu sentia serem necessários para alinhar a forma como jogos eram criados (mais sobre isso a seguir).

Mas a melhor coisa sobre a Wildlife, eu aprendi logo no começo: ela é um lugar cheio de gente talentosa e trabalhadora, que também são humildes, sempre prontas a aprender e divertidíssimas para se ter por perto. Então pensei “vai ser legal trabalhar com essa galera”.

Para mim, esse é o detalhe mais importante: ter uma grande equipe com quem trabalhar. Eles também são, se me permite a alusão, algo como um “diamante bruto”, porque ao mesmo tempo em que eles traziam um enorme compromisso e talento, eles também não tinham muita experiência, já que poucos aqui haviam trabalhado na indústria de jogos antes.. Então eu achei que essa poderia ser uma jornada interessante e, compartilhando da mesma paixão por criar grandes jogos, decidi entrar para o time.

Inicialmente, eu fui contratado como chefe de Engenharia. Isso fazia muito sentido, simplesmente porque eu aceitei a proposta imaginando que eu trabalharia junto ao Mike. Mas logo quando entrei, eu percebi que, embora existissem departamentos como “Arte” e “Engenharia”, eles não eram integrados da forma que deveriam, e a empresa não tinha exatamente um “estúdio de jogos”.

Então eu peguei essa ideia de unificar o desenvolvimento de jogos e implementar processos, estruturas e métodos apropriados. Eu conversei sobre isso com a equipe executiva e, na minha terceira semana, o Victor (Lazarte, nosso CEO) me promoveu para a chefia do nosso Game Studio. Ele concordou comigo quando disse que precisávamos construir uma nova estrutura organizacional, e levantar um estúdio de desenvolvimento de jogos de primeira linha para nossos jogos. Sem pressão, né?

CRIANDO JOGOS: O MESMO OBJETIVO, MAS COM PROCESSOS DIFERENTES

Há algumas diferenças entre criar um jogo “AAA” para consoles de mesa e um jogo gratuito para dispositivos móveis. Quando eu trabalhei como Vice Presidente da Sony Computer Entertainment Europe (SCEE), nosso objetivo não era apenas criar os melhores jogos, mas também o de fazer a plataforma PlayStation ter uma imagem grandiosa.

Com jogos “AAA”, você normalmente desenha e desenvolve jogos em um período de dois ou três anos. Não se usa muitos dados durante estas fases; há muita experiência e intuição envolvidas, e você inevitavelmente acaba fazendo apostas bem grandes. Os orçamentos e prazos podem ser muito maiores do que aquilo que se vê no mobile. Isso vem mudando conforme a indústria cresce, mas no geral, os jogos “AAA” são um negócio de “tiro certeiro”: você corre grandes riscos, mas colhe grandes recompensas.

Na Codemasters, apesar de ter criado alguns jogos mobile, eu desenvolvia principalmente jogos “AAA” para consoles e computadores pessoais (PC), mas o negócio era bem focado na construção de títulos de corrida, o que na época era a especialidade da empresa, e ainda é.

Os jogos da Codemasters eram uma operação bastante especializada, completamente focada em um gênero específico. Nós normalmente trabalhávamos com nenhuma “folga” e prazos bastante apertados. Se precisássemos lançar um jogo dentro de um ano, jamais poderíamos aceitar atrasos. Os times envolvidos trabalhavam muito duro para criarem grandes jogos de corrida dentro das datas estimadas de lançamento, e são algumas das melhores equipes do mundo.

Quando eu cheguei a Wildlife, eles me contaram que protótipos normalmente eram construídos em apenas quatro semanas! Dentro de dois meses, o jogo já estaria em alguma loja de aplicativos, coletando dados e feedback de usuários. Isso é espetacular! É muito revigorante ter a capacidade de criar protótipos de jogos tão rapidamente e lançá-los para coletar métricas muito úteis, que nos ajudam a compreender o nosso público e direcionar o desenvolvimento de um jogo. 

Nós utilizamos essas métricas para criar mecânicas melhores para um jogo e – se me permite o auto elogio aqui – essa é uma forma sensacional de se desenvolver. Você tem um feedback bem rápido e usa esses dados para aprimoramento de uma forma muito mais otimizada do que se vê em jogos para consoles. No entanto, é importante ressaltar que esse processo não tem a mesma visão holística do design de um produto “AAA” para consoles. Esta é uma das coisas que eu quero trazer à Wildlife por meio de minha experiência. Eu quero integrar, cuidadosamente, algumas dessas metodologias “AAA” dentro de nosso processo evolutivo de desenvolvimento de jogos.

Antes de me juntar ao time da Wildlife, eu já havia feito alguns jogos mobile, seja a criação de apps sinérgicos para jogos de console, ou jogos completos de corrida para smartphones e tablets. Nunca foi muito claro para mim o que fazia a diferença entre esses dois formatos, os que nunca se tornaram bem sucedidos, e os jogos de maior audiência. Mas depois tudo passou a fazer mais sentido, e eu percebi que há uma grande diferença na abordagem sobre como criar esses jogos, além de como eles são divulgados e distribuídos. De fato, há uma enorme disparidade entre criar um jogo mediano para dispositivos móveis, comparada à criação de um título líder de mercado como a Wildlife já desenvolveu tantas vezes.

Os modelos de negócios desses dois mundos também são bem diferentes: o sucesso de um jogo para consoles pode chegar quando você superar a marca de um milhão de cópias vendidas – o melhor jogo de corrida que fizemos [na Codemasters] vendeu quatro milhões e foi um enorme sucesso para nós.

No mundo mobile, isso é bem diferente: nosso jogo Sniper 3D tem mais de 400 milhões de downloads! É claro, os modelos de faturamento são bem diferentes, mas o potencial dos jogos mobile é enorme e o mercado está crescendo bem mais rapidamente do que o de consoles e PCs. A Wildlife está chegando agora a um bilhão de downloads de nossos jogos – essa é uma marca simplesmente incrível.

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NEM TUDO SE RESUME A DADOS E DESENVOLVIMENTO DE JOGOS

Como você pode observar, eu tive muitos motivos para me juntar à Wildlife mas, ao final de tudo, a principal razão foram as pessoas. Eu encontrei aqui uma equipe inteligente, comprometida e apaixonada por criar grandes jogos, e pensei no quão prazeroso seria trabalhar com ela. Depois de nove meses, eu vejo o quanto isso é verdade. Eu amo o meu trabalho na Wildlife, liderando o nosso Game Studio e levando o negócio para frente.

Estou provocando várias e notáveis mudanças para melhorar a forma como fazemos jogos, e meu time é apaixonado pelo o que faz e ótimo para se trabalhar. A nossa cultura é ambiciosa e temos planos de nos tornarmos uma das três maiores empresas de games do mundo. Esse é, obviamente, um objetivo bem grandioso, mas eu acho que temos toda a matéria-prima necessária para atingi-lo e, se trabalharmos duro e de forma inteligente, tenho total confiança de que iremos conseguir.

Sendo inteiramente honesto com você: se me perguntassem, um ano atrás, se eu me via trabalhando em uma empresa de jogos para celular, eu definitivamente responderia “Claro que não”. Mas eu acredito firmemente que, na vida, você tem sempre que continuar aprendendo. Então dar esse salto em direção à Wildlife me deu o melhor de dois mundos: eu posso aprender muito sobre como criar os maiores jogos para plataformas móveis, ao mesmo tempo em que ajudo a aprimorar a forma como criamos esses jogos por meio de minha experiência com jogos “AAA”, e gerenciando estúdios de desenvolvimento mundialmente bem sucedidos.

A Wildlife sempre teve um incrível volume de sucesso. Em nove anos, Victor e Arthur (Lazarte, co-fundadores ao lado de Mike Mac-Vicar) transformaram o negócio que eles começaram escrevendo linhas de código na casa da mãe, com apenas $100, para uma empresa com mais de 600 colaboradores, que vale mais que um bilhão de dólares! Eles criaram alguns dos melhores jogos para dispositivos móveis.

Então um dos meus objetivos principais era, antes de tudo, compreender totalmente em que a empresa era realmente boa, o que a fez atingir esse nível de sucesso, para depois identificar onde ela poderia melhorar, além de criar sistemas que ajustassem as coisas que não funcionavam muito bem. Eu me certifiquei de, a cada passo tomado, incluir minhas equipes nessas discussões, pois ser inclusivo é algo crítico quando se fazem mudanças. As equipes precisam tomar propriedade dessas mudanças para que você tenha aceitação: sem isso, você provavelmente vai falhar no meio do caminho.

Sempre que você ingressa a uma empresa e tenta empregar mudanças, é natural que as pessoas sintam um certo medo. Especialmente em um negócio que já vinha tendo sucesso dentro de uma história tão curta. Ao longo dos anos, eu aprendi o quão importante é você dedicar um tempo para ouvir seus colaboradores e aprender o que os negócios já vêm fazendo de bom, para que você consiga preservar as coisas que são boas ao mesmo tempo em que identifica aquelas onde você pode alavancar mudanças de maior impacto.

REVISANDO OS NOSSOS VALORES

Uma das primeiras coisas que discutimos quando eu entrei para a Wildlife foram os valores da empresa. Era apenas a minha primeira semana, mas eu achava que poderíamos melhorá-los.

Então, um dia, quando as equipes de gestão se juntaram para uma reunião nas Ilhas Galápagos, eu disse ao Victor: “a gente devia repensar os nossos valores”. Victor disse “Então, vamos!” – e antes que eu me desse conta, embarcamos nesse enorme processo criativo.

Eu tive todo o cuidado de incluir todos os times de gestão dentro dos nossos valores, além de dividir outras mais de 120 pessoas em grupos de trabalho que nos ajudassem a refinar e recriar esses valores.Como elas estavam envolvidas nisso, elas se sentiam “donas” de tudo. Era tudo delas tanto quanto era nosso. Quando anunciamos os novos valores a toda a empresa, eu pedi que alguém do time operacional os apresentasse um a um, para mostrar a todos que estes eram “nossos” valores, nós acreditávamos neles e nós éramos os “donos” deles. Esse é o segredo para se criar uma grande cultura empresarial.

Uma das coisas em que estamos trabalhando agora é no aprimoramento de nossa marca global. Antes de me juntar à Wildlife, eu nunca tinha ouvido falar na empresa, simplesmente porque, por muitos anos, ela não tinha o interesse de promover-se. Eu até entendo o motivo, já que ela tinha sucesso sem esse esforço. Mas para levar a empresa ao próximo nível, nós devemos recrutar pessoas talentosas do mundo inteiro e, por isso, ter uma marca reconhecida tornou-se importante para nós.

Queremos criar uma base feliz e fidelizada de bilhões de jogadores ao redor do mundo. Então, no ano passado, promovemos um rebranding da empresa, nos tornando a Wildlife que você conhece hoje. Agora, estamos ativamente promovendo a companhia para nos colocarmos sob os holofotes do mundo.

Nós já recrutamos pessoas espetaculares de alguns dos maiores estúdios do mundo e isso é só o começo. Também vamos aumentar nossa presença de marca em torno de nossos jogos para que, quando alguém começar uma partida em grandes títulos como Zooba ou Tennis Clash, as pessoas saibam que a Wildlife está por trás deles. Isso é importante para construirmos a nossa base ao longo do tempo, para que jogadores fiquem mais empolgados quando ouvirem falar de nossos jogos. 

Além disso, nós também criamos um excelente time de suporte ao jogador e gestão de comunidade em Dublin, Irlanda, o qual está grandemente aprimorando a nossa percepção junto a fãs. Temos até programas VIP para cuidar dos interesses de nossos jogadores mais valorizados, e isso tem se provado tão popular que estamos expandindo esse serviço para todos os nossos principais jogos. Somos muito mais ativos hoje em dia quando nos conectamos com nosso público.

O objetivo, obviamente, é o de criar e juntar fãs que se empolguem com nossos jogos. Para nos certificarmos de que as pessoas estão felizes e bem atendidas por nós, temos encontros com influenciadores que nos ajudam a conseguir mais downloads orgânicos de nossos produtos, e essa conexão é a mais importante. Estamos conhecendo nossos jogadores e entendendo o que eles querem, alimentando uma comunidade da Wildlife – e isso tudo é essencial no cumprimento de nossa missão, que é a de criar títulos que serão jogados e lembrados por gerações.

FALANDO EM FUTURO

Cuidar da nossa cultura é um dos aspectos mais importantes do meu trabalho. Como eu gerencio a minha equipe, como eu coordeno e promovo o estúdio, tudo isso é feito com os nossos valores em mente. Eles estão no centro de tudo o que fazemos. Eu vivo por esses valores, e meu time de gerentes funciona da mesma forma.

Eu acho que fizemos um ótimo trabalho ao trazer esses valores para o nosso Game Studio em São Paulo, e logo vamos começar a construção de um segundo, criando um novo time e começando a implementar esses valores desde o início. Ao termos um conjunto claro de missões e rituais e processos de desenvolvimento, nós podemos integrar novas equipes dentro da empresa de forma eficaz.

Nós também estamos ampliando as iniciativas relacionadas a diversidade e inclusão dentro da empresa. Isso nos tornará mais culturalmente ricos e nos permitirá entender melhor a novos públicos e tomar melhores decisões de design para nossos jogos.

Olhando para o futuro, temos muitas coisas planejadas: estamos a todo vapor criando um novo estúdio de desenvolvimento em São Paulo. Vamos também aumentar as operações atuais para que possamos entregar mais jogos, mais rápido do que nunca. Seguimos trabalhando duro, contratando novas e talentosas pessoas com experiência neste setor para acelerar nossa jornada e nos ajudar não apenas a crescer, mas sim crescer de forma inteligente.

Essas novas experiências nos permitirão desenvolver nosso staff interno, acelerando progressos individuais e nos levando a um aumento de escala de negócios da melhor forma. Nós também estamos nos expandindo globalmente, construindo e adquirindo novos estúdios ao redor do mundo.

Definitivamente, temos um grande desafio para atingirmos nossos objetivos. Mas é isso que torna tudo tão empolgante, e tenho certeza de que vamos conseguir realizar tudo isso. O que faz a Wildlife tão espetacular é isso: tivemos muito sucesso até agora sem o benefício de processos consolidados e experiência, então pense no quanto podemos fazer agora que estamos incorporando essas coisas maravilhosas a tudo o que aprendemos até aqui.

Há um enorme potencial para o nosso futuro se fizermos isso do jeito certo – e nós vamos fazer isso juntos, nos divertindo e nos comprometendo a cada passo. Estamos prontos para o que nos espera!

Wildlife jul 22, 2020 Mick Hocking